segunda-feira, 20 de julho de 2009

ANÁLISE DO POEMA DE BAUDELAIRE COM BASE NO TEXTO “ESTRUTURALISMO E CRÍTICA LITERÁRIA”


Por Alline Gonçalves do Nascimento DRE: 107408519



Com base no texto “Estruturalismo e crítica Literária” quero tecer alguns comentários que servirão como base de análise e contextualização do Estruturalismo do ponto de vista deste trabalho. Sobre a técnica da Bricolage que* “consiste em exercer sua atividade utilizando conjunto de instrumentos..que não foram fabricados em vista dessa atividade” e a Técnica de síntese que utiliza elementos diversos nos quais se unem para formar um novo elemento, exercendo funções distintas das anteriores e que estão muito presentes no estruturalismo.

O estruturalismo é uma corrente de pensamento que teve por base o modelo lingüístico de Ferdinand Saussure. Propondo que a análise estrutural leve a delinear a associação que existe entre um sistema de formas (signo) e um sistema de sentidos (idéia de significado).

As técnicas citadas anteriormente permitem a este modelo que se apropria da obra inicial ( de sua estrutura) e dela retira o que será útil ( formas menores) e a partir desta recria algo novo mas que tem o subsídio em uma estrutura já existente ou seja um significado maior na qual a obra já está mergulhada.

Contudo a análise estruturalista se dá no momento em que encontramos revelado no código a mensagem de forma a pertencer a esta estrutura. De acordo com os comentários feitos acima lanço algumas considerações acerca do poema “A destruição” do poeta Baudelaire, que foi um dos precursores do simbolismo na França.

A DESTRUIÇÃO

Sem cessar, ao meu lado, o Demônio arde em vão;
Nada em torno de mim como um ar vaporoso;
Eu degluto-o e sinto-o, a queimar-me o pulmão,
Enchendo-o de um desejo eterno e criminoso.

Toma, ao saber o meu amor à fantasia,
A forma da mulher, que eu mais espere e ame,
E tendo sempre um ar de pura hipocrisia,
Acostuma-me a boca a haurir um filtro infame.

Longe do olhar de Deus ele conduz-me assim,
Quebrado de fadiga e numa ânsia sem fim,
Às planícies do tédio, infinitas, desertas,

E atira aos olhos meus, cheios de confusão,
Ascorosos rasgões e feridas abertas,
E os aparelhos a sangrar da Destruição

O poema é composto de dois quartetos e três tercetos onde a musicalidade se evidencia na primeira e segunda estrofe na combinação fonética entre os primeiros e terceiros versos (Vão/ pulmão – fantasia/ hipocrisia) e os segundos e quartos versos (vaporoso e criminoso- ame /infame). Nos dois últimos tercetos a musicalidade se mantém através da contínua combinação de fonemas.

Outra característica evidente no poema seria a sinestesia que leva ao leitor a experimentar o poema através dos sentidos humanos como na primeira estrofe “Eu degluto-o e sinto-o, a queimar-me o pulmão”.

A presença do Demônio ao lado do eu-lírico logo no primeiro verso nos indica a afirmação do tema “Destruição” trazendo nesta primeira estrofe, palavras (signos) que trazem o mesmo significado por pertencerem a mesma estrutura semântica como: Demônio, arder, queimar, eterno e criminoso.

Na segunda estrofe o jogo de palavras na expressão, “pura hipocrisia” se opõem a idéia do Amor como forma de pureza encontrada no Naturalismo por exemplo, que agora já não é suficiente para purificar os amantes, então se transforma em “pura hipocrisia”.

Na terceira estrofe o eu-lírico revela seu estado de alma usando adjetivos como fadigado, ansioso e tedioso.

Por fim ele deixa claro que a sua frente tem uma realidade que o fere e que o faz sofrer e queimar disseminando a destruição.

Para concluir este trabalho percebe-se que o objeto em si, se torna visível a partir de sua estrutura, que neste caso seriam suas características lingüísticas e formais citadas acima. No entanto essas características não se limitam e esta obra e junto com outras fornece modelos (estruturas) para que uma nova corrente ou maneira de ver a realidade se estabeleça a partir da recomposição, maneira pela qual foi constituída a obra inicial, ou seja, sua síntese.

BIBLIOGRAFIA

WWW.wikipedia.com.br

Visitado 16 de julho às 21h.

Estruturalismo e critica literária. (texto copiado da pasta de Teoria Literária Prof. :Caio)

Aluna: Alline Gonçalves do Nascimento DRE: 107408519

Sobre a Atividade Estruturalista

Por Nathália Nicácio Ganzer

DRE: 107364155


Segundo Mouton & Co., La Haye, (1962), estrutura é um termo já antigo, de origem anatomista e gramatical. Antes de mais nada, para que se possa entender o termo estruturalismo, devemos lembrar o velho esquema determinista de causa e produto, significado-significante e sincroniadiacronia a fim que possamos nos aproximar do que diferencia o estruturalismo de outras formas de pensamento.

Dessa forma, inicialmente somos remetidos ao modelo lingüístico saussuriano e, posteriormente, somos levados a um estruturalismo que se converte em história, na medida em que a idéia de sincronia torna-se uma certa imobilização de tempo, enquanto a diacronia, por sua vez, passa a representar uma sucessão de formas.

Além disso, não podemos esquecer que o estruturalismo, tal como é caracterizado, pode ser transferido também para a metalinguagem intelectual, a qual usa explicitamente conceitos metodológicos. Esses conceitos metodológicos, por conseguinte, tornam o estruturalismo essencialmente uma atividade que respeita etapas, como por exemplo, a ênfase na forma (o objeto se apresenta de forma constante), a obra é vista como um sistema de significação e de códigos, no qual os elementos relacionados ocupam determinadas posições de modo que, ao alterar uma posição, todo o poema é alterado, o que torna a obra uma supercodificação e se dá preferência ao método analítico em detrimento ao sintético, posto que durante o processo de análise da obra, dá-se uma separação entre os objetos e os elementos estruturais desta, remetendo-nos a um trabalho de bricolage.

Não obstante, é importante ressaltar, nesse contexto, o objetivo da atividade estruturalista. Seja ela reflexiva ou poética, a atividade estruturalista possui o papel de reconstituir um “objeto”, de modo que, dá-se, nessa reconstituição, as regras de funcionamento desse objeto. Assim, essa atividade, portanto, é um lugar de simulação dirigido e interessado, já que durante a simulação, coisas que pareciam invisíveis a olho nú, tornam-se visíveis e intelígiveis no processo de composição e “de”-composição.

Ora, nesse momento de decomposição estrutural, dá-se algo novo, posto que o objeto decomposto e agora, intelígivel e decodificado, fora acrescentado de intelecto. É justamente esse o fator que torna a atividade estruturalista de suma importância, posto que não se trata apenas de uma “impressão do mundo”, mas de uma fabricação verdadeira de um mundo que se assemelha ou que mimetiza o primeiro, contudo, sem copiá-lo e tornando-o cada vez mais intelígivel. Em suma, recompõem-se o objeto para que suas funções internas sejam vistas e para que se descubra o caminho feito pela obra.

Assim, a atividade estruturalista comporta duas atividades principais: desmontagem e arranjo. Primeiramente, desmonta-se o objeto e se procura nele certos elementos móveis cuja situação diferencial gera certo sentido. Dessa forma, o fragmento não tem sentido em si, isto é, ele é livre, contudo, qualquer variação, por menor que seja, produz uma mudança do conjunto. É nesse contexto que surge a noção de arranjo, posto que, quaisquer que sejam as unidades, elas só possuem existência significativa devido as suas fronteiras, as suas relações de intimidade e extensão e também, por se distinguirem de outras unidades virtuais, com as quais elas formam uma certa classe, denominada pelos lingüistas de paradigma.

Na verdade, o que caracteriza o objeto paradigmático é a sua presença em certa relação de afinidade e dessemelhança. Logo, um paradigma deve conter duas unidades que se assemelhem, de modo que suas diferenças sejam vistas como um raio.

Dessa forma, embora as unidades estruturais pareçam sem conexão e até mesmo, anárquicas, antes de serem descodificadas e reunídas em um processo de composição, cada uma é dotada de uma reserva inteligente, submetida a um motor soberano: a menor diferença.

Numa obra, portantanto, a análise deve ser feita de modo que sejam fixadas e descobertas regras de associação, para que assim, a atividade de composição ou arranjo seja realizada de modo extremamente natural e não aja, por conseguinte, um embate entre o acaso e a forma, posto que, ao mesmo tempo que a arte é retirada do acaso, é a forma que permite a contigüidade das unidades não parecer fruto do acaso. Em suma, é isso que faz com que o homem, numa espécie de mímesis, traga novo sentido e inteligencia às coisas.

Análise do poema “O Veneno” de Baudelarie

O Veneno

Sabe o vinho vestir o ambiente mais espúrio (A)

Com seu luxo prodigioso, (B)

E engendra mais de um pórtico miraculoso (B)

No ouro de um vapor purpúreo,(A)

Como um Sol que se põe num ocaso nebuloso.(B)

O ópio dilata o que contornos não tem mais, (C)

Aprofunda o ilimitado, (D)

Alonga o tempo, escava a volúpia e o pecado, (D)

E de prazeres sensuais (C)

Enche a alma para além do que conter lhe é dado. (D)

Mas nada disso vale o veneno que escorre (E)

De teu verde olhar perverso, (F)

Laguna onde minha alma se mira ao inverso... (F)

E meu sonho logo acorre (E)

Para saciar-se nesse abismo em fel imerso. (F)

Nada disso se iguala ao prodígio sombrio (G)

Da tua saliva forte, (H)

Que a alma me impele ao esquecimento num transporte,(H)

E, carreando o desvario, (G)

Desfalecida a arrasta até os umbrais da morte! (H)

De acordo com o método estruturalista, proponho uma análise na qual o objeto (o poema de Baudelaire) seja considerado não individualmente, mas como uma relação estrutural e funcional.

Podemos observar que o poema é formado por quatro estrofes, contendo cada estrofe cinco versos. Além disso, notamos que os versos ímpares são alexandrinos e os versos pares são heptassílabos (redondilhas menores). Quanto à disposição (A-B-B-A-B), as rimas são interpoladas.

Quanto ao valor das rimas, na primeira estrofe temos rimas pobres, posto que rimam classes gramaticais iguais, sendo a primeira estrofe toda rimada por adjetivos. A segunda estrofe, por sua vez, é composta por rimas ricas, já que as classes gramaticais das palavras “mais e sensuais” e “ilimitado, pecado e dado”são diferentes. Na terceira estrofe, as rimas novamente são pobres e na última estrofe, ricas.

Contudo, ao analisar o poema ainda de forma estruturalista, ou seja, descobrindo e fixando regras de associação, trazendo sentido, inteligência e função ao objeto, podemos constatar no poema o que Erich Auerbach já havia observado na poesia de Baudelaire: a incorporação a matéria da realidade grotesca à linguagem sublimada do romantismo. Assim, podemos retirar do poema expressões como “ambiente mais espúrio”, “volúpia”, “pecado”, “veneno”, “sombrio”, “saliva”, “abismo”, “fel”, “desvario”, “umbrais”, “morte” que comprovam essa observação de Auerbach.

Assim, no primeiro verso da primeira estrofe “Sabe o vinho vestir o ambiente mais espúrio”, ou seja, ele sabe vestir o ambiente mais desonesto “Com seu luxo prodigioso” , isto é, com seu luxo maravilhoso, fantástico “E engendra mais de um pórtico miraculoso”, gerando mais de um portal miraculoso. Notamos nesses três primeiros versos, que o vinho não é entendido como coisa, como objeto que é, mas sim com características humanas, pois ele “sabe vestir” e ele “engendra”. Além disso, “E engendra mais de um pórtico miraculoso/ No ouro de um vapor purpúreo,/ Como um sol que se põe no ocaso nebuloso.”, temos no quarto verso uma sinestesia, já que sensações diferentes são misturadas, como o “vapor”, que nos dá uma sensação quente com a cor púrpura, vibrante. Dessa forma, temos a sensação de que o próprio vapor provém da própria cor púrpura (vermelho-escuro, tendente para o roxo). Esse pórtico miraculoso gerado pelo vinho é comparado ao Sol que se deita no poente nebuloso.

Temos assim, uma antítese entre “púrpura” e “nebuloso” e podemos notar também que a primeira estrofe transmite ao leitor uma sensação de incerteza, de coisas falsas, pois o vinho veste o ambiente mais espúrio com um luxo prodigioso, gerando um portal “miraculoso”, como algo que praticamente não pode existir por ser um milagre, e também pela presença de vapor, de nebulosidade. Na verdade, aos olhos do ébrio, os passos são incertos e há uma presença dúbia, tornando o real incerto, posto que há o real e há também uma projeção do real, que na verdade, é uma ilusão criada pelo poder do álcool. Por isso, o vinho, enquanto metonímia de álcool, é capaz de engendrar coisas.

Na segunda estrofe, vemos que o mesmo se dá com o ópio, pois ele dilata o que não possui mais contorno, aprofunda o ilimitado, alonga o tempo, escava a volúpia, podendo nesse contexto, não ser apenas a luxúria, mas também grande prazer de todos os sentidos e de todas as sensações, escavando o pecado, transbordando a alma de prazeres. Também notamos, nesse contexto, que o ópio recebe características mais humanas, pois é ao ópio que são conferidas todas essas ações mais humanas.

Contudo, o eu-lírico usa do ópio e do vinho como forma de compará-los ao “(...) veneno que escorre/ De teu verde olhar perveso”. E acrescenta, “Mas nada disso vale”, isto é, mas nem o vinho nem o ópio se comparam com o poder que possui o veneno que escorre do olhar perverso da figura que tanto o atrai, tanto o hipnotiza. Assim, na terceira estrofe ainda é feita uma metáfora, pois o olhar é “Laguna onde minha alma se mira ao inverso...”. Ao pensarmos no inverso da alma, podemos pensar em refletir uma figura no espelho ou na água. Ao fazermos isso, temos a projeção dessa figura vista do lado contrário da figura real e assim é vista a alma do eu-lírico nesse olhar, nessa laguna. Nessa hipnose, o sonho do eu-lírico vem em seu auxílio, a fim de “saciar-se nesse abismo em fel imerso”.

O eu-lírico acrescenta ainda, que nem o ópio nem o vinho se igualam à maravilha sombria “Da tua saliva forte”, saliva essa que impele a alma do eu-lírico ao esquecimento, guiando-a ao desvario, e enfim, desfalecida, é arrastada até os umbrais da morte!

Dessa forma, portanto, o olhar da figura amada atrai o eu-lírico, de modo que o deixam em um estado de torpor semelhante ao coma, impelindo a alma ao esquecimento, hipnotizando-a, guiando-a ao desvario e por fim, tal como um veneno, levando sua alma a morte

Análise de um poema de Lope de Vega

Por: Andressa Gonçalves Bianco DRE: 107367909



O fumo que formou corpo fingido
que por mais denso, mais repousa em nada;
o vento que passou com força alada
sem poder pela rede ser colhido;

o pó nas regiões desvanecido
de uma primeira nuvem dilatada;
a sombra, a forma ao corpo apartada,
que abdicou de ser tendo partido,

são palavras de mulher. Sobrevinda
novidade qualquer, o assombro é tanto
que lealdade, amor ou fé se findam.

É só mudança, o nome, desencanto,
Pois quanto mais segura, quem a prende
Tem sombra, fumo, nada, pó e vento.


Na primeira frase a palavra fumo corresponde a fumaça, e a palavra fingido mostra ao leitor que não é um corpo estável. Já na segunda frase o que se vê é um paradoxo, ou seja, algo que é ou parece contrário ao senso comum. Já na terceira linha a palvra alada quer dizer “com asas”, ou seja, uma “força com asas”.

Já na segunda estrofe, segunda linha, temos a palavra nuvem, que significa algo ou alguém transitório, e sombra, que parece ser um corpo mas não é. O vento, a fumaça, a nuvem e o pó representam elementos transitórios. E na última linha tem–se a palavra abdicou, ou seja, não existe. E essa última frase tem um caráter metafórico, onde a significação natural de uma palavra é substituída por outra com que tem relação de semelhança.

Desde o início do poema até a terceira estrofe, são palavras de mulher, mostra que a mulher é volúvel, que não é digna de confança. Sobrevinda novidade, isto é, acontecendo alguma novidade, amor ou fé se findam, ou seja, acabam.

Na quarta e última estrofe temos o nome, desencanto, que representa o nome da mulher, e nas duas útimas linhas, quem a prende tem sombra, fumo, nada, pó e vento, isto é, quando o homem acha que a tem (a mulher), ele na verdade não tem NADA, ou seja, com este poema Lope de Veja mostra que não se pode confiar nas mulheres, e é considerado um poema machista.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

AS DIFERENTES VISÕES SOBRE O LEITOR E SUA IMPORTÂNCIA NA LITERATURA

Por
KAREN PEREIRA FERNANDES DE SOUZA

Aqui examinamos um elemento literário para quem uma obra é escrita: o leitor. Alguns estudos literários se opõem radicalmente em que uns o excluem por completo e outros o valorizam tanto que o colocam em primeiro lugar valorizando a sua leitura. Durante muito tempo, o historicismo, o formalismo e o New Criticism ignoravam o leitor porque defendiam a obra literária como uma unidade auto-suficiente em que o poema existe por si só, como um monumento verbal, desprendido de seu autor e de seu leitor. Concordavam em baní-lo, pois consideravam suas faculdades interpretativas muito limitadas, além de atribuírem a ele a má compreensão e as falhas da leitura mesmo que estes problemas não estivessem no leitor. Para eles, o leitor ideal é aquele que se curva à expectativa do texto, que seja passivo ao texto, lendo e interpretando fielmente o que está escrito. A narratologia e a poética chegam a atribuir um papel para o leitor, que não é muito diferente do pensamento acima: um leitor abstrato ou perfeito, ao qual nenhum leitor real poderia se identificar. O filósofo I. A. Richards, depois de suas experiências com seus alunos, também concorda com os pensamentos acima e que para corrigir as deficiências e limitações dos leitores numa leitura fechada (uma leitura ideal), eles deveriam ser ensinados a ler cuidadosamente respeitando a liberdade e a autonomia do texto.

Enquanto alguns o excluem, outros trazem o leitor de volta ao centro dos estudos literários, como Proust que defendeu e conferiu ao leitor um importante papel: não o de compreender o livro, mas o de compreender a si mesmo através do livro porque o leitor aplica o que ele lê na sua vida, porque ele aprende com a leitura sobre várias questões perfeitamente aplicáveis no seu dia-a-dia. Em O Tempo Redescoberto, Proust escreve: “a escritura é descrita como a tradução de um livro interior, e a leitura como uma nova tradução num outro livro interior” (COMPAGNON, 2003: 145). É interessante ele dizer isso porque quando o autor escreve uma obra é impossível ele ser imparcial o tempo todo, ele acaba imprimindo suas impressões, experiências, fatos que aconteceram com ele. E o leitor vê nessa experiência, nessa vivência lida no texto algo aplicável para a sua vida. Se podemos dizer que uma vida é um livro aberto e que a experiência de uma pessoa é o que preenche as páginas deste livro, então cada um de nós, leitores, temos um livro interior. Muitas outras abordagens teóricas passaram a valorizar o leitor, como exemplo a hermenêutica.

Assim, chegamos ao conceito de recepção. Ora, uma palavra bastante clara e transparente, recepção, ou seja, as impressões que alguém recebe de alguma coisa, em outras palavras, aquilo que o leitor adquire, recebe, absorve, até mesmo a reação/efeitos em função do que leu, podendo ser esta recepção por um indivíduo ou por um conjunto de pessoas que leram a mesma obra literária. Antes, a recepção era vista não sob a forma de leitura, mas por uma obra motivar a criação de outras obras, medindo o destino de uma obra pela a sua influência. “Análise mais restrita da leitura como reação individual ou coletiva ao texto literário”; “visa ao efeito produzido no leitor, individual ou coletivo, e sua resposta”, só se chegou a este conceito graças aos historiadores da escola dos Annales.

Esta recepção pode ser dividida em duas categorias: a fenomenologia, que vai cuidar do ato individual da leitura; e a hermenêutica, que vai cuidar da resposta pública (coletivo) ao texto. Para as duas concepções o tempo real é importante, porque o objeto literário não é nada mais do que uma matéria no espaço graças à imprensa, um volume ocupando uma prateleira da estante, configurando-se texto somente no ato da leitura ou enquanto este ato puder durar. E o mais interessante: o sentido do texto que não está no texto propriamente escrito (porque o texto só instrui), mas no produto da leitura, na fusão de elementos dispersos e incompletos construídos pelo leitor com o auxílio de suas experiências adquiridas antes mesmo da presente leitura.

“[...] o texto literário é caracterizado por sua incompletude e a literatura se realiza na leitura. A literatura tem, pois, uma existência dupla e heterogênea. Ela existe independentemente da leitura, nos textos e nas bibliotecas, em potencial, por assim dizer, mas ela se concretiza somente pela leitura. O objeto literário autêntico é a própria interação do texto com o leitor”. COMPAGNON, 2003: 149.

Assim, chega-se à noção de autor implícito e a de leitor implícito. O autor nunca se retira totalmente de sua obra, deixando ativo o seu substituto: o autor implícito; é como se fosse um piloto automático, um narrador da história, que vai descrevendo os cenários e hipnotizando o leitor, introduzindo-o à cena, enquanto o autor real revela as ações das personagens, dando emoção ao leitor. O leitor é percebido ao mesmo tempo como ativo e passivo: o leitor implícito é passivo ao texto, ele tem o papel de absorver as predisposições fornecidas pelo autor, ele só entende o que é dado; nada mais é do que uma construção do texto, uma estrutura textual pré-determinada; e é ele que mostra esses dados absorvidos ao leitor real que é ativo e tem a função de construir o sentido do texto com a ajuda do seu repertório (conhecimentos adquiridos ao longo da vida, isto é, conjunto de normas sociais, históricas e culturais que constituem a competência de um leitor). Um não se identifica com o outro.

Desta forma, podemos dizer que a leitura é a reunião dos dados fornecidos pelo autor real e o autor implícito ao leitor real que tem o auxílio do leitor implícito. Ou, como é dito no texto: “[...] o ato da leitura consiste em concretizar a visão esquemática do texto [...], a construir uma coerência a partir dos elementos dispersos e incompletos. A leitura se apresenta como uma resolução de enigmas.” (COMPAGNON, 2003: 152).

Se o leitor real constrói o sentido do texto com a fusão do seu repertório com os dados que o leitor implícito absorveu do texto isso significa que a obra literária é aberta, ou seja, o texto tem suas lacunas que só podem ser completados por elementos externos ao texto através do leitor real. O que nos faz acreditar nessa abertura é o resultado diferente da leitura de um texto onde dois leitores (pelo menos) lêem o mesmo texto de modo diferente. Ou melhor, a obra literária ela está entreaberta, porque conta com a participação tanto do leitor quanto a do autor, fazendo com que o leitor ora seja imposto ora livre. A liberdade concedida ao leitor está na verdade restrita aos pontos de indeterminação do texto, entre os lugares plenos que o autor determinou. “Assim, o autor continua, apesar da aparência, dono efetivo do jogo: ele continua a determinar o que é determinado e o que não é.” (COMPAGNON, 2003: 155).

O gênero trata-se de mais uma categoria da recepção, pois funciona como um esquema de recepção (pelo seu conjunto de normas e regras), que ajuda ao leitor a compreender o texto, ou o que esperar dele. “[...] as convenções históricas próprias ao gênero, ao qual o leitor imagina que o texto pertence, lhe permitem selecionar e limitar, dentre os recursos oferecidos pelo texto, aqueles que sua leitura se realizará.” (COMPAGNON, 2003: 158). Aqui, não podemos deixar de mencionar a tripartição clássica dos estilos: sublime, trágico e grotesco que perdura por muito tempo, mas agora com outros nomes: romance, sátira e história ou melhor, pior ou igual ao mundo real (baseados na dualidade da comédia e tragédia), que regula a forma como o leitor vai investir no texto.

Fish redefine a literatura (mudando o nome para estilística afetiva) como “o que acontece quando lemos”. E vai mais longe, acaba com a disputa de autoridade entre autor, texto e leitor reduzindo às autoridades das “comunidades interpretativas”, o que para alguns significa a decadência da teoria da recepção, pois estaria retirando toda a liberdade, a subjetividade e autonomia concedida outrora ao leitor, fundindo esta tríade (autor-textoleitor) em uma coisa única, isto é, as “comunidades interpretativas” representam as normas de interpretação (literária e extraliterárias) que um grupo compartilha sem a intervenção subjetiva de qualquer leitor pertencente ao grupo, agora o sentido do texto não pertence mais ao leitor e sim às comunidades interpretativas, pois este grupo já compartilha das mesmas ideias e opiniões.

Concluindo, o leitor que por bastante tempo foi ignorado passa a ter total liberdade e autoridade sobre o texto, tirando de cena tanto o autor quanto o próprio texto, porque ele se torna a peça principal do jogo, é nele que está o segredo do significado do texto já ele possui um repertório, um conhecimento externo ao texto aplicado à obra para preencher as lacunas que o autor determinou. Mais tarde, juntamente com o autor e o texto o leitor é reduzindo às comunidades interpretativas. Uma obra literária não pode ter somente uma peça principal, mas sim, um conjunto, e no caso em questão três: o leitor, o texto e o autor; cada um com as suas funções sem haver a necessidade de serem reduzidos às comunidades interpretativas. Respeitando as funções desta tríade, o leitor pode continuar a ser livre para produzir o sentido do texto, dentro de uma liberdade permitida, sem destruir a teoria da recepção.

BIOGRAFIA: COMPAGNON, Antoine. Leitor. In: O demônio da teoria. Belo Horizonte: UFMG, 2003. p. 139-164


sábado, 11 de julho de 2009

such small hands

4 traduções para um poema de e.e.cummings...


e.e.cummings
somewhere i have never travelled, gladly beyond
any experience, your eyes have their silence:
in your most frail gesture are things which enclose me,
or which i cannot touch because they are too near

your slightest look easily will unclose me
though i have closed myself as fingers,
you open always petal by petal myself as Spring opens
(touching skilfully, mysteriously) her first rose

or if your wish be to close me, i and
my life will shut very beautifully, suddenly,
as when the heart of this flower imagines
the snow carefully everywhere descending;

nothing which we are to perceive in this world equals
the power of your intense fragility: whose texture
compels me with the color of its countries,
rendering death and forever with each breathing

(i do not know what it is about you that closes
and opens; only something in me understands
the voice of your eyes is deeper than all roses)
nobody, not even the rain, has such small hands



Tradução de Rodrigo Garcia Lopes:
em algum lugar que nunca visitei, felizmente além
de qualquer experiência, seus olhos retém o seu silêncio:
nos seus gestos mais frágeis há coisas que me encerram,
ou que não posso tocar porque estão perto

seu olhar mais breve me desabrocha feito pétalas
mesmo que eu sempre me feche como dedos,
você me abre sempre, pétala por pétala, como a primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) sua primeira rosa

ou se seu desejo fosse estar perto de mim, eu e
minha vida encerraríamos com beleza, de repente,
como quando o coração dessa flor imagina
a neve descendo docemente em todos os lugares

nada do que eu possa perceber neste mundo é igual
à força de sua intensa fragilidade: cuja textura
me mistura com a cor de seus campos,
retribuindo a morte e o eterno a cada sopro

(não sei dizer o que há em você que se fecha
e se abre: só um pedaço de mim compreende que a voz
de seus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas



Tradução de Augusto de Campos:
nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade: cuja textura
compele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas



Tradução de Jorge Wanderley:
em algum lugar onde nunca estive, e felizmente aquém
de qualquer experiência, teus olhos guardam seu silêncio:
em teu gesto mais frágil há coisas que me envolvem
ou que não posso tocar porque estão muito próximas

teu olhar mais leve facilmente me descerra
embora eu me tenha fechado como dedos,
e me entreabres sempre, pétala por pétala, como a Primavera
(por toques habilidosos, misteriosamente) abre a primeira rosa

ou se teu desejo é me fechar, eu e
minha vida nos fecharemos formosa e rapidamente
como quando o coração desta flor imagina
que a neve - cuidadosamente - está caindo em toda a parte;

nada do que podemos perceber neste mundo se compara
ao poder de tua intensa fragilidade; cuja textura
me compromete com a cor de seus países
e me entrega para a morte cada vez que respiro

(nada sei do que te faz tão poderosa
ao me mover; mas algo em mim compreende apenas
que a voz de teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem as mãos tão pequenas



Tradução de Rui Werneck:
em algum lugar que nunca fui, alegremente para além
de qualquer experiência, seus olhos têm silêncio próprio:
em seu mais débil gesto existem coisas que me enclausuram,
ou que eu não posso tocar porque estão muito perto

seu mais rápido olhar facilmente me captura
e no entanto eu me fechei como dedos,
você me abriu pétala por pétala como a primavera
abre (tocando habilmente, misteriosamente) sua primeira rosa

ou se você deseja me fechar,
eu e minha vida nos fecharemos belamente,
de repente, como quando o coração das flores imagina
a neve caindo devagarinho sobre tudo;

nada se percebe nesse mundo igual
ao poder da sua intensa fragilidade: cuja textura
me compele para as cores dos seus campos
traduzindo por hoje e sempre com sua respiração

(eu não sei o que é sobre você nos fechamentos
e aberturas; apenas alguma coisa em mim entende
que a voz dos seus olhos é tão profunda como todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva, tem mãos tão pequenas

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Cópias não serão aceitas

Gostaria de alertar a todos que não poderei aceitar trabalhos que sejam cópias, recortes, montagens de textos chupados da WEB. A única exigência que faço é que todos os trabalhos sejam originais, isto é, que o autor ou os autores tenham de fato escrito as frases de seu trabalho. Qualquer citação, pequena ou grande, deve ser sinalizada por meio de nota de fim ou parênteses. Abraços a todos,
Caio

terça-feira, 7 de julho de 2009

A linguagem literária

A literatura é uma arte, uma manifestação estética de grande valor. E como toda arte, possui um objeto estético, aquilo que está presente no mundo e que deve ser recriado. A literatura recria as palavras. É por isso que costumamos enunciar a Literatura como a arte da palavra.
Há muitas coisas além desta breve definição. Não é válido afirmar que a Literatura é a arte da palavra sem antes compreender o que é arte. Pois, se Literatura é uma manifestação artística, é de vital importância o entendimento da palavra arte para que, então, seja possível trabalhar com os conceitos de Literatura.
O mundo real está repleto de coisas: pessoas, animais, plantas, matéria inanimada etc. E todos nós somos capazes de perceber a existência e a utensilidade dessas coisas. Acontece que a percepção de toda a matéria existente é algo muito comum, uma visão profundamente automatizada, que almeja sempre a utensilidade dos objetos. É justamente neste ponto em que a arte atua: ela amplia a nossa percepção da realidade, desautomatizando os objetos e dando a eles uma percepção singular. Para o artista singularizar a noção de realidade, precisa ser movido pela percepção estética, ter um olhar desautomatizador.
A palavra é o material primordial da literatura, constituindo seu objeto estético. Acontece que, mesmo a palavra precisa ser desrealizada e recriada. No cotidiano, a palavra é um mero utensílio que serve para comunicar idéias e pensamentos, ou seja, é um signo lingüístico formado por um significado e seu respectivo significante. É deste uso que se servem as linguagens históricas, filosóficas e científicas. Todavia, depois que o processo da mímesis atua sobre a palavra, desrealizando-a e recriando-a, esta deixa de ser um utensílio e passa a constituir um objeto artístico. Deixa de ser apenas um signo lingüístico para tornar-se uma imagem, um signo literário.
Neste signo literário, um único significante tem vários significados e mesmo o significante significa. Quando um texto alcança este patamar de linguagem, denominamo-lo literário.
A Literatura é uma recriação da realidade; mas essa recriação se dá a partir da recriação da linguagem. É com a linguagem que o artista da palavra transforma o utensílio em objeto estético. E neste caso, o objeto é o código lingüístico. Mais precisamente, o autor não só utiliza o código, mas transgride-o. É devido a essas transgressões que o texto literário provoca um estranhamento ao leitor. Junto a esse estranhamento, estão os significados da obra literária, que não vêm expressos claramente. Pois a literatura trabalha com os “silêncios”, o “não-dito” ou ainda – e como é mais típico dizer
– nas “entrelinhas”. Mas que artifícios o artista da palavra utiliza para elaborar construções tão ricas? Que marcas diferenciam este tipo de construção dos demais textos? Que outras peculiaridades podemos identificar dentro de uma obra literária?
Pode-se apontar uma importante característica literária: sua autonomia. Todo texto literário é autônomo semanticamente, isto é, tem poder suficiente para estruturar e organizar seu próprio mundo. Por este mesmo motivo a linguagem literária basta a si própria, é verdadeira por si mesma, não podendo ser verificada, apenas explicada.
Baudelaire, em “Correspondências” recria a realidade e a localiza numa natureza especialmente construída pela atividade poética num mundo expressivo próprio ao poema. O templo de vivos pilares não é a natureza empírica da qual Baudelaire buscaria aproximar-se numa tentativa de comunhão, mas uma recriação artificial do que poderia ser a imagem de tal harmonia.
Mesmo sendo o mundo da literatura um lugar autônomo, este não perde completamente os vínculos com o mundo real. A ficção literária e a realidade empírica jamais se desprendem, pois o mundo literário não consiste em uma mera deformação do mundo real, mas a criação de uma realidade nova que preserva o vínculo significativo com o real objetivo.
O texto não-literário prima pelo predomínio da denotação, pois para textos de cunho científico, filosófico e histórico a objetividade na maneira como as informações são veiculadas é muito importante. Em contrapartida, a linguagem literária é predominantemente conotativa.
Contudo, a conotatividade não é uma propriedade pertencente apenas à literatura: ela está presente também em outros textos não-literários, como o discurso político, por exemplo. A própria comunicação pela fala faz uso de inúmeras conotações. Acontece que a conotatividade literária é uma componente de um fenômeno mais complexo e extenso a que se convencionou chamar por ambigüidade.
Devido aos fatos anteriormente esclarecidos, seria mais adequado tomarmos a Linguagem Literária como plurissignificativa; nela, o signo lingüístico carrega em si múltiplas dimensões semânticas, diferençando-se do significado unívoco próprio da linguagem monossignificativa de textos não-literários.
Num plano sincrônico ou horizontal, a palavra adquire dimensões plurissignificativas graças às relações conceptuais, imaginativas, rítmicas, etc., que contrai com os outros elementos que constituem o seu contexto verbal. “A obra literária é uma estrutura, um sistema de elementos interligados, e a palavra só ganha valor quando integrada nesta unidade estrutural.”
Outra questão que merece ser discutida, diz respeito à transgressão das normas e da alta criatividade presente em um texto literário. A linguagem literária desvia-se, sistematicamente, da norma padrão com o objetivo de colocar em primeiro plano as propriedades imagísticas do texto e de desfamiliarizar as percepções automatizadas do leitor. Isto é, a língua literária não é gramaticalmente "correta” porque descaracterizando a norma culta o autor tem muito mais a dizer do que se ele simplesmente utilizasse a forma gramaticalmente aceita para falar o que pretende.
Este comentário nos conduz a outro elemento importante: A literariedade, em oposição à literalidade. Quando o artista da palavra rejeita a norma, ele nega a literalidade, e se apropria da literariedade. Ou seja, para recriar a realidade, faz uso de uma deformação criadora, que provoca ao leitor um certo estranhamento – visto que o texto está construído de maneira inovadora.


Alunas:Camila Duarte DRE:108062277 e Sorraine Alcântara DRE: 108062984
Turma :LEB

domingo, 5 de julho de 2009

A percepção do romance de terror gótico através da estética da recepção

ESTE TRABALHO FOI COPIADO DE http://www.filologia.org.br/viiicnlf/anais/caderno12-10.html...




A percepção do romance de terror gótico através da estética da recepção
(Frankenstein de Mary Shelley)


A Estética da Recepção considera a literatura um sistema que se define por produção, recepção e comunicação, tecendo uma relação dialética entre autor, obra e leitor. Não revitaliza a noção de produção e representação, bases da estética tradicional. Destaca que o ato de leitura tem uma perspectiva dupla na dinâmica da relação obra - a projeção desta obra pelo leitor de uma determinada sociedade. Interessa-se pelas condições sócio- históricas que formularam as diversas interpretações que o texto ficcional recebeu, e assinala que o discurso literário é o resultado de um processo de recepção ao mover a pluralidade destas estruturas de sentidos historicamente mediadas.

Frankenstein, de Mary Shelley (1999) abriu uma nova perspectiva para um novo tipo de gênero romanesco, mais tarde conhecido como ficção cientifica. Este texto permite preencher vazios explicitando as relações de poder e a subversão destas relações numa ficção que deixa vir à tona o processo que marcou a tradição romanesca e a fundamentação sólida da sociedade moderna.
A Estética da Recepção permite compreender o sentido e forma da obra literária pela variedade histórica das suas interpretações. Exige, por outro lado, que a obra individual seja introduzida na seqüência literária adequada, o que permitirá reconhecer o seu papel histórico no contexto das experimentadas pela literatura "séria" e poderemos captar todo o seu potencial criativo, Os textos teóricos selecionados nos permitirão uma leitura mais atenta da importância cultural, filosófica, psicológica e ideológica do modo.
O estilo gótico, deslanchando novas formas do bizarro em meio aos ideais de harmonia clássica, decoro público e normas comportamentais, afirma o poder de uma literatura da desrazão silenciada pelas Luzes e apoiada em noções sobre o belo, o prazer, o gosto e o bem que irrompem na arte do horror. O gótico se presta a essas idéias, ao transportar para a ficção motivos irracionais, mistérios insondáveis, a expressão do numinoso.
A literatura gótica vincula-se ao Sublime, não somente pelos padrões de imagens convencionais, mas também pela rede de relações psicológicas reconhecidas anteriormente por Longino, cuja poética inovou uma teoria verdadeiramente afetiva da literatura. O poder da retórica domina o Sublime quando a linguagem do poeta, trabalhada, evoca no ouvinte / leitor um entusiasmo correspondente. As palavras distanciam-se de seu contexto denotativo e se investem da experiência da singularidade. O Sublime é o ponto mais alto e a excelência do discurso que tenta não a persuasão, mas o arrebatamento do ouvinte.
Longino e os filósofos que se ocuparam com o estudo e a regulamentação de uma Poética do Sublime afirmam um aspecto mais sombrio que se desenvolve nesta época, quando tentam moldar a experiência individual além do controle da consciência. As discussões, no final do século XVII, refletem uma atmosfera cada vez mais gótica, associada ao modo sombrio, melancólico, passional. O temor e o terror são a fonte profunda do prazer e do poder estético.
Qualquer coisa que seja terrível em relação à visão é também Sublime, e certa obscuridade é necessária para transformar qualquer coisa em terrível. Se, na experiência sublime tudo é incerto, sombrio, confuso, terrível, talvez o terror resulte do fato de que na sombra, na escuridão, é impossível distinguir onde as coisas começam e terminam. Subjetivamente, o terror é causado quando somos incapazes de distinguir o Eu do Outro, ou por tornarmo-nos incertos da divisão do que é e do que não é o Eu.
O texto ficcional adquire sua função, não pela comparação ruinosa com a realidade, mas pela mediação de uma realidade que se organiza por ela e o gótico apresenta uma realidade permeada pela obsessão da morte, da violência, da perversão sexual, do macabro e do sobrenatural, que exploram uma psique coletiva, ponto culminante de transformações sociais
O gótico e suas convenções chamam a atenção do leitor, ao descortinar um modo de falar sobre a relação da linguagem que problematiza as relações urbanas sociais e sexuais, que se movem entre o jogo de velar e desvelar, especularmente, tratando-se da passividade e da vitimização da mulher nesse novo panorama. O modo não vai transformar o real em ficcional, mas vai propor uma transcrição da visão de mundo que se orquestra a partir de desordens que abrem para o novo homem urbano um quadro aterrorizante.
Essas idéias transcritas acima ajudam a compreensão da literatura gótica e em como esta se apodera da Historia para mostrar seus desvios, com um espaço que afirma um presente dissoluto, vislumbra um alhures e cria uma arquitetura para reafirmar as regras de um espaço ameaçado pela nova sociedade. Essência indefinível, sugestão e maneira de captar o mundo na fruição da duplicidade, perversão ou realização de uma poética fundamentada sobre uma estética do efeito, o gótico apresenta imagens discordantes de uma realidade que se interioriza e marca mudanças nas metáforas descritivas da criação artística.

Frankenstein

Mary Shelley, filha de dois escritores, William Godwin e Mary Wellstonecraft, encontrou nos pais o auxílio para formar sua personalidade literária. Bastante versada na cultura de seu tempo, a jovem cria a primeira obra de ficção cientifica, inaugurando uma nova era. A primeira vista, o livro parece oferecer uma serie de valores românticos típicos do século XIX, refletindo as idéias revolucionarias e não-convencionais. Uma leitura mais atenta, porem, sugere que estes mesmos valores são questionados pelos principais acontecimentos do enredo.
Mary Shelley trabalha a interação obra e mundo, apresentando uma obra que pode ser lida de diversas formas. Produzida num contexto que via surgir o declínio do poeta como demiurgo, o ato de criar toma a direção da fantasia sobrenatural, fugindo de uma concretização esquematizada. E isto tem a ver com a depreensão do imaginário e sua natureza pois
O difuso do imaginário e a condição para que ele seja capaz de assumir configurações diversas, o que e sempre exigido pois se trata de tornar o imaginário apto para o uso. A ficção e a configuração apta para o uso do imaginário (porque) cria possibilidades dele se organizar, mas provoca tematizações pragmáticas correspondentes. (/..) A ficção é a configuração contrafactual da realidade existente; ela ultrapassa os limites dos dois planos - imaginário e real". (Lima, 1983: 379).
Mary Shelley trabalha esta dialética do imaginário e propõe três narrativas que se interconectam, contadas por homens totalmente destituídos do sentimento de vida familiar. Cada um deles apresenta a perspectiva de negação desta experiência. Walton, Victor e a criatura são seres que problematizam o TER da vida burguesa. Walton está determinado a encontrar regiões no Pólo Norte para nelas viver e deseja partilhar sua descoberta com a humanidade, da mesma maneira que Victor. Os dois se encontram - duplos/parceiros no isolamento. Victor, para gerar uma vida artificial se exila da humanidade, dos confortos da casa, da noiva. Incapaz de confessar seus atos, não consegue avisar sua família do perigo que a ronda. A criatura, centro da narrativa, por sua vez esta colocada como um marginal na sociedade; sem família, apreende o mundo pelos livros e, enfurecido por comportamentos para ele incompreensíveis, aniquila todos que possam contribuir, de alguma forma, para com a vida feliz de seu criador.
Vivendo numa época que já mostra os sinais da decadência de uma ordem que não satisfazia as demandas do real, Mary Shelley parece impregnada das idéias da mãe e delas se serve para criar uma fantasia que fale sobre os efeitos periculosos e perniciosos da manutenção rígida das esferas masculina e feminina do domínio público. Trabalho x lazer, razão x imaginação são a tônica que impulsionam subversivamente o real ficcional. Inocência x marginalidade são eixos que determinam os narradores.
As três narrativas concêntricas impõem um desdobramento linear da linha do enredo. Inicia e termina com Walton, escrevendo para sua irmã inglesa, da periferia exterior do mundo civilizado, limite entre o conhecido e o desconhecido. Deste ponto caminhamos para dentro do círculo da civilização, os arrabaldes rurais de Genebra centro da ética Protestante. Neste lugar, homens e mulheres demonstram os bons sentimentos, a compostura e o decoro decorrentes das convenções tradicionais. As famílias ligadas à temática estão bem codificadas. Estas famílias não mostram a visão de tantos romances da época, com as aventuras que sempre apresentaram finais felizes, triunfando sobre qualquer posicionamento contrário.
Temos em Frankenstein, o caminho oposto. Os leitores se deparam primeiro com a civilização e seus descontentes, em suas tentativas de resgatar-se dentro desta sociedade com aventuras miraculosas que atinjam o valor de uma regeneração de vida. A circularidade do enredo enfatiza outro tipo de vida mantida pela consciência das personagens que se vinculam a outros valores. Cegos para quaisquer outros contextos, Walton e Victor, na rea1idade, não se compreenderam ainda como trânsfugos sociais. Mary Shelley não tematiza o processo inconsciente que os leva ao isolamento, mas trabalha a transcendência dos valores que permeiam suas ações.
O que seria mais tarde conhecido como o jargão dos oprimidos, tem na obra de Mary Shelley o valor de uma profecia: os alicerces da futura sociedade das massas onde a relação opressor x oprimido se torna mais patente; a liberdade de ação torna-se mais "limitada e idéias de retaliação e vingança são a tônica de um ciclo inteiro de autodefesa, mutuamente perniciosa e geradora da destruição.
Frankenstein é uma narrativa sobre a dialética da opressão na perspectiva ampla do opressor e do oprimido, perpassando para a família e daí para a sociedade como um todo. Talvez melhor do que qualquer historia gótica, a obra retrata o trabalho extremo de uma forma diatônica da alteridade. Expõe com clareza os resultados infelizes da recusa em validar as necessidades e o direito da existência de Um x o Outro.
Ao deixar sua casa, Victor Frankenstein torna-se melancólico, inicialmente, mas o objetivo de suas pesquisas em atingir o Conhecimento retira-o do contexto do círculo doméstico. Chega a dar vida a uma criatura, mas por não ser capaz de entender as vinculações de sua ação, afasta dela qualquer tipo de elo afetivo, negligenciando seu papel. A criatura, sem mesmo receber nome, perde a identidade e a possibilidade de conseguir enquadrar-se socialmente, pois o nome representa a autodefinição e a pertença social. Ser insignificante, é sempre mencionada como demoníaco, espectro, monstro, sempre repelida pelos outros por seu aspecto desproporcional, um Outro diferente e ameaçador à sociedade. Desesperado e isolado, determina-se ao aniquilamento de ambos, criador e criatura. A combinação dos elementos textuais tem ressonância na vida comum; a estatura da criatura/monstro de Victor tem seu análogo nas máquinas que aparecem na Inglaterra e são de estatura gigantesca; a tecnologia de então tinha "monstros mecânicos enormes, que Blake em 1808 chamara de "dark Satanic mills ". (Tropp, 19, 56)
Entre o homem e seu substituto - a máquina - existe incerteza e temor; um sentido de urgência leva o próprio homem a se questionar sobre as demandas do real que se robotiza e sofistica, deixando em aberto o futuro - foco central de Frankenstein, quando a relação do homem com seu tempo se modifica pelas hélices metálicas que orquestram o novo tempo. A protéica vitalidade da obra e da visão da autora projetam as grandes aberturas que o século XIX trouxe ao homem: um novo espaço, a transformação da vida, a percepção de um novo tempo, a imagem de um outro homem.
Pelo fato de esta escola recomendar a questão da autonomia da arte compreendida na sua gênese produtiva e analisada na dimensão histórica de sua receptividade a fim de que ela possa conciliar a função social da comunicação com a função estética, este trabalho foi realizado.
O modo gótico está associado a uma certa qualidade de efeito de 1eitura, pois exerce sobre o leitor um poder baseado na estética do Sublime, idéias desenvolvidas no século XVIII, ao propor uma mudança na retórica poética, na estética das artes e da literatura. Com impacto surge a criação do romance, determinada pelas sensibi1idades oriundas do reconhecimento que uma nova era carregada de potencialidades e transformações dirige o homem para outras posturas.
O gênero literário burguês, em sua essência, ganhou formas multifacetadas a partir de demandas de um novo público. A ascensão gradual da burguesia; renovando valores, modificar do aspirações, coisificou o real do universo e suas relações: o espaço público passou a ser um observatório privi1egiado da diversidade, ponto estratégico para apreender o sentido de todas as transformações.
Baseado na estética do sublime e do terror, o gótico nasce abrindo brechas para novas fronteiras; bastante significativo e o fato de ter sido um tipo de gênero que influenciou as primeiras abordagens de Freud em relação à fantasia, a formulação do inconsciente e seus sintomas, e a imagética que formulou em sua ciência, confirmando os estudos de Varma que viu no gótico um modo diretamente responsável pela descoberta do inconsciente, relacionado aos estados de ansiedade e aos processes internes subjetivos
Mary Shelley apresenta uma obra com determinantes potenciais de inovação, e faz um balanço do mundo problematizando agora os anseios e as expectativas do homem que estranha o mundo que vive, que tem a sensação de ter sua vida organizada a partir de demandas exteriores que transcendem a sua própria existência; no jogo aberto de uma intertextualidade flutuante "na "luta entre homens e símbolos. Mary Shelley mostra as perdas, as "imposições violentas, e os choques que estão a vista nesta nova sensibi1idade, marca inaugural de uma época que visa emancipar o homem, mas na realidade o agrilhoa aos deuses da técnica. Faz o diálogo com o presente momento, não como uma falsa ou ingênua adaptação as expectativas de significado de nossa época, mas demonstra que o próprio homem, a própria sociedade traça na armadilha de sua própria astúcia.
Frankenstein apresenta uma metáfora gótica da modernidade. Uma alegoria que transforma a linguagem referencial desrealizar a expressão através de uma linguagem sugestiva e densa na problemática do homem em busca de conhecimento. Aliena a poética ao propor a inquietação, a incerteza de sentido, propicia a ironia do distanciamento e leva o leitor a usufruir os caminhos do Sublime. Faz da psique humana mito e cenário góticos. Walton e Victor são criaturas a procura de um ponto indeterminado que e o próprio espaço da criação imaginaria.
No seu jogo ficcional, Mary Shelley reconduz a função de comunicação da obra e apresenta sua resposta às expectativas do leitor, demonstrando como sua arte, ao interferir / questionar a realidade de sua atualidade, engendra o próprio caminho histórico do homem de hoje.
Referências bibliográficas
LIMA, Luis Carlos (org.). A 1iteratura e leitor. Textos da Estética da Recepção. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979
LONGINO, On the Sublime. In C1assica1 Literary Criticism. New York: Penguins, 1955.
SHELLEY, Mary. Frankenstein or the Modern Prometheus. London: Oxford University Press, 1999.
TROPP, Martin. Images of Fear - How horror stones helped Shape modern culture. North Caroline: McFardland, 1990.


Aluna: Karina Aline da Silva Santos
Teor Lit IV – Turma 9:20


Manifestação Estruturalista

De acordo com os assuntos discutidos durante o curso de Teoria Literária IV, estruturalismo é uma corrente de pensamento originada da linguística de Ferdinand Saussure e que caracteriza a relação social como um conjunto de relações, que formam uma estrutura. Entendemos que esse conjunto de relações pode ser caracterizado como um modo de pensar, ou uma maneira de ver o mundo, a partir do raciocínio de que o estruturalismo é um método de análise, onde se analisa as funções e relações dos sistemas, criando modelos explicativos da realidade. De acordo com a teoria do estruturalismo, os significados dentro de determinada cultura são produzidos e reproduzidos através de diversas práticas, fenômenos e atividades que funcionam como sistemas de significação.

A abordagem estruturalista dá ênfase na forma, acreditando que a forma é reflexo da essência. De acordo com essa corrente de pensamento, a obra deve ser vista como um sistema de significação demonstrada através de códigos. O poema, por exemplo, é considerado uma supercodificação e, para compreendê-lo é necessário utilizar-se do método analítico.

Para o estruturalismo, o todo é mais importante e maior que a soma das partes, visto que as partes simbolizam as relações e o todo, a estrutura. De acordo com a teoria estruturalista, não existem fatos isolados, pois esses fatos são considerados partes de um todo maior. Com isso, para compreender algo, é necessário observar tudo o que está relacionado.

Observamos também que o estruturalismo não pode ser visto apenas como um método, mas também como uma tendência de pensamento, ou uma ideologia, onde se valoriza a estrutura às custas das substâncias, onde se pode supervalorizar seu valor explicativo.

Comparando o estruturalismo com a hermenêutica, constatamos que o estruturalismo se diferencia um pouco da hermenêutica pelas diferentes posições críticas adotadas por cada um, porém ambos estão bastante unidos. A hermenêutica possui uma idéia de círculo hermenêutico, onde não é possível compreender o todo sem que entendamos as suas partes, ou compreender as partes a menos que entendamos o todo. Esta visão, o estruturalismo não possui. Para ele, as partes não possuem significado se forem analisadas isoladamente. Acreditamos que estruturalismo e hermenêutica se complementam, visto que extraem significações complementares.

O objetivo da atividade estruturalista se dá em reconstituir um objeto, manifestando suas regras de funcionamento. A estrutura é uma simulação do objeto, onde se faz possível visualizar o que era invisível, ou impossível de ser compreendido no objeto inicial. A criação estruturalista não é uma impressão do mundo, mas uma re-fabricação desse mundo, de forma que ele possa ser compreendido, o que nos leva a concluir que o estruturalismo é uma atividade de imitação, com o objetivo de facilitar a compreensão.


Bibliografia:

Textos: “Estruturalismo e Crítica Literária” e “A Atividade Estruturalista”

Anotações em aula.


Por Caroline Campos Macedo – DRE 106078044 e Laís Costa Ferreira – DRE 107390952

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A MODERNIDADE EM BAUDELAIRE

1- A modernidade na composição poética

A importância de Baudelaire na tradição literária do ocidente consiste basicamente na instauração da Modernidade (haja vista o fato de que fora ele quem forjou o vocábulo Mordenité) na estrutura lírica de composição poética. Esta modernidade se vai caracterizar pela dialética de razão e paixão no nível da estrutura e do sentido da construção poemática. Isto significa dizer que se vai harmonizar em sua obra o máximo de vigor passional com o máximo de rigor racinal. Como já foi dito, essa harmonização se dá no nível estrutural (no que se diz respeito a forma que delineia o sentido ) e no nível semântico (no que diz respeito ao sentido delineado pela forma); agora, a importância dessa harmonização de duas potências consideradas estanques por toda a tradição do pensamento ocidental (razão e paixão) é que a vida em si mesma não promove a separação dos contrários pois que tudo o que se manifesta , não apenas no fazer humano, mas na vida cósmica em geral, se dá a partir dessa tensão harmônica de essências opostas.
Por exemplo, não se dá o surgimento de todas as cores sem o entrelaçamento de luz e trevas, não nasce uma nova árvore sem a morte da semente e assim por diante.
Quando Baudelaire aplica essa harmonização de contrários no fazer poético, ele está aproximando a arte literária da vida , mostrando que a ficção não é algo estanque da realidade circundante.

2- A modernidade como representação dos conflitos nas grandes cidades

A realidade que cercava Baudelaire era a de mudanças na estrutura da sociedade ocidental nos séculos XIX e XX com o evidenciamento da vida urbana e com a instauração de uma nova ordem burguesa e capitalista, que acabaram por chocar o sujeito urbano desse tempo já que essa nova ordem era constituída sem um centro fixo ou um organizador comum.
A Paris, do Segundo Império no século XIX, em que o poeta viveu, também como as outras grandes cidades ,sofreu essas transformações por meio do surgimento de uma vida urbana, da construção de grandes avenidas, mercados ,teatros etc, fazendo com que a convivência das pessoas se transferisse de suas casas para as ruas cada vez mais movimentadas da cidade e com que diversas classes sociais, como desde um aristocrata a um réles da sociedade se defrontassem num mesmo local.
A construção dessa metrópoli-labirinto além de expor os contrastes sociais, também contrastava o indivíduo com a multidão. Pois ao chegar na rua o sujeito urbano perdia sua individualidade e passaria a ser simplesmente mais um na multidão.
Neste momento, também presenciamos uma modernização no comércio que traz para o parisinense uma inovação : as galerias e suas vitrines ilumindas que ao mesmo tempo que expunham a mercadoria, fascinavam aquele que vagava pelas ruas.
O que traz à cena o flâuner, muito retratado nas obras de Baudelaire; um errante que se entrega a compulsão de sujeito urbano, que passeia prazerosamente sem destino pelas galerias e pelas ruas da metrópoli-labirinto mas, que ao mesmo tempo não perde sua natureza inumana.
Em meio a essa experiência nova, onde o sujeito poderia se defrontar com a multidão e com a velocidade das mudanças na sociedade moderna, Baudelaire viu-se obrigado a refletir e a trabalhar essas transformações que trouxeram à tona esses constrastes sociais outrora camuflados e a expor essa dualidade presente na arte e na vida , dedicando a esse tema -modernidade, vários de seus textos poéticos e ensaios.

3- A definição de modernidade para Baudelaire

Segundo o filósofo Walter Benjamim, Baudelaire é o primeiro poeta a trabalhar em sua obra a crise e os constrastes da modernidade capitalista e industrial.

Em seu ensaio "Le peintre de la vie moderna" que foi dedicado ao pintor Constantin Guys por quem Baudelaire não esconde admiração e não poupa elogios à sua arte, vemos a demonstração mais clara do conceito de modernidade em Baudelaire quando ele afirma que o artista, ou melhor, como ele recoloca , o homem do mundo, ou seja aquele que não está submetido à uma área específica , mas que se interessa e aprecia assuntos do mundo inteiro (assim ele define Guys); retira da moda atual e de seu momento histórico o que tem de poético, portanto, retira do transitório o que tem de eterno para alcançar a essência do belo.
"A modernidade é o transitório,o efêmero,o contigente, é a metade da arte, sendo a outra metade o eterno e o imutável"

4- Conclusão

Baudelaire não foi entendido por sua época sendo pouco lido e tendo alguns de seu poemas proibidos.
Talvez, porque tenha provocado na sociedade um certo horror por representar com muita maestria o choque que a modernidade capitalista e industrial causou em seu tempo.
Uniu o clássico com o moderno, denunciou por meio de uma dualidade sempre presente em seus poemas (pois para ele a modernidade está ligada à noção de conflitos) os constrastes sociais de sua cidade, aproximando a arte da vida, promovendo importantes reflexões que ecoam até os dias de hoje.


Bibliografia:
BAUDELAIRE, Charles. "O pintor da vida moderna". In: Obras Completas

Por:
Lúcia R. R. (DRE 086210714) e Taáte P. Tomaz Silva (DRE 107369090)

As diferentes faces da Leitura

Este trabalho tem como objetivo apresentar como a leitura e o leitor foram vistos ao longo da história de maneiras tão radicalmente distintas.
A abordagem pragmática é a abordagem que se ocupa do leitor. Existem estudos literários que ignoram totalmente o leitor e existem também os que o valorizam, ou até mesmo o colocam em primeiro plano na literatura, eles correspondem a literatura à leitura. Vemos, então, duas opiniões a respeito da leitura muito divergentes. A crítica científica e a histórica, por exemplo, não viam com bons olhos o que elas chamavam de crítica impressionista. Essa última expressava seus sentimentos e opiniões pessoais sobre a literatura, nas crônicas dos jornais e revistas. Era então uma crítica totalmente subjetiva. Anatole France, um dos principais críticos impressionistas dizia: “Para falar francamente, o crítico deveria dizer: Senhores, eu vou falar de mim, a respeito de Shakespeare, a respeito de Racine.” Tal frase soa bastante interessante pois o leitor se identifica claramente com a obra. Há então uma interelação entre o leitor e a obra.
Em contraste a essa leitura subjetiva temos a leitura objetiva. Inclusive essa última afirma que não é leitura. Lanson, um dos representantes dessa leitura objetiva, que se pretende ser culta, diz: “O exercício da explicação tem como objetivo e, quando bem praticado, como efeito, criar nos estudantes o hábito de ler atentamente e interpretar fielmente os textos literários.” Ou seja, vemos que nessa leitura objetiva, a interpretação pessoal, assim como o gosto pessoal são claramente deixados de lado. Podemos, inclusive, caracterizar tal leitura objetiva como uma leitura fria, na qual o gosto e o sentimento não aparecem e não devem aparecer. Podemos até dizer que se trata de uma análise fria da obra literária. Se pararmos pra pensar e aí, expresso a minha opinião pessoal, se analisarmos uma obra partindo desse ponto de vista, frio, objetivo, podemos até enxergar que, de fato, se trata de uma leitura autêntica já que não vamos deixar o nosso gosto pessoal interferir e, assim, dizer que a obra não é boa, sendo ela na verdade boa, mas como o assunto não nos interessa, julgamos não ser boa. Isso me fez lembrar de um conhecido que uma vez comentou: "eu não gosto de Paulo Coelho... aquela coisa de esoterismo... eu detesto dessa coisa de esoterismo... mas tenho que admitir que ele escreve bem". Isso ilustra bem a questão proposta do texto, apesar de ele dizer que não gosta do autor por não gostar do assunto sobre o qual ele escreve, ele soube deixar o gosto pessoal de lado, ou seja, a leitura subjetiva dele de lado, para apreciar as qualidades do autor como escritor e, consequentemente, soube ver a qualidade do livro como obra literária, ele soube usar da leitura objetiva do texto, que deixa de lado o gosto pessoal do leitor.
Mallarmé, negando a leitura, diz em seu “Quant au Livre”(Quanto ao Livro), que "o livro não necessita nem do autor nem do leitor para existir, ele existe por si mesmo, sendo ele próprio. Do mesmo modo que a escritura da obra moderna não pretende ser expressiva, sua leitura não reivindica identificação por parte de ninguém".
A exclusão do leitor foi principalmente formulada pelos New Critics americanos do entreguerras. Estes defendiam que a leitura deveria ser objetiva, fechada, chamada close reading. Seu lema era “um poema não deve significar, mas ser”. Eles recomendavam que o poema deveria ser analisado minuciosamente, parte por parte, para que os significados fossem retirados. Eles pregavam que o leitor devia, a todo custo, se desvencilhar da “ilusão afetiva”(affective fallacy), que para eles era equivalente a ilusão intencional (intentional fallacy). Vemos então que há a leitura que pode iludir o leitor. Por exemplo, um leitor que se interessa muito por um determinado assunto ou se identifica com a própria personalidade do autor do livro, pode ler esse livro e considerar uma obra-prima, sem esse ser de fato uma obra-prima. A leitura no caso iludiu o leitor ou o leitor mesmo se deixou iludir.Windsatt e Beardsley, dois dos New Critics, afirmam: “A ilusão afetiva é uma confusão entre o poema e seus resultados (o que ele é e o que ele faz)".
Um dos fundadores do New Criticism, o filósofo I. A. Richards inicialmente era a favor da leitura empírica, subjetiva, na qual o leitor leva em conta o seu gosto pessoal e sentimento para analisar uma obra literária. Mas depois, Richards, adotou uma postura totalmente antisubjetivista através do experimento com seus alunos de Cambridge, que relatou no livro Practical Criticism, (Crítica Prática, 1929). O experimento consistiu em os alunos comentarem livremente poemas que Richards os apresentava, sem citar o nome do autor. Os alunos deveriam ler sucessivamente os poemas, no mínimo quatro e no máximo doze vezes e então anotar as reações que tinham a cada leitura. O resultados foram de uma maneira geral catastróficos. Se caracterizaram principalmente pela presença de imaturidade, arrogância, falta de cultura, incompreensão, clichês, preconceitos, sentimentalismo, psicologia popular etc. Todas essas deficiências se tornavam um problema para o leitor, que não conseguia assim compreender o verdadeiro sentido do poema. Ao contrário de muitos críticos, que acreditavam que para os “maus leitores” não havia solução, Richards manteve contra tudo e todos, a convicção de que tais deficiências da leitura poderiam ser eliminadas através da educação. Richards afirmava: “A poesia pode ser desconcertante, obscura, difícil, ambígua, mas o problema principal está com o leitor, a quem é preciso ensinar a ler mais cuidadosamente, a superar suas limitações individuais e culturais, a respeitar a liberdade e a autonomia do poema.” Ou seja, essa teoria bem longe de questionar os princípios do New Criticism reforçava a necessidade da leitura fechada, objetiva, que não leva em conta a opinião e o gosto pessoal do leitor.
A crítica em relação ao leitor sempre foi levada em conta em diversos estudos literários, como no positivismo, no formalismo, no New Criticism e no estruturalismo. O leitor empírico, a má compreensão, as falhas da leitura perturbam todas essas abordagens, quer digam respeito ao autor ou ao texto. Ou seja, fazendo uma má-leitura podemos julgar uma obra boa, como ruim assim como considerar uma obra ruim como boa. Por isso, todos esses métodos têm a predisposição de ignorar o leitor ou, como Richards fez, formulam uma própria teoria como uma disciplina da leitura ou uma leitura ideal, com o propósito de eliminar as falhas.
Acho todas essas questões muito interessantes e que poderia haver ainda uma longa discussão sobre o assunto. Esse texto me fez enxergar que, ao lermos uma obra literária, devemos ter cuidado ao a julgarmos como boa ou ruim pois, tal julgamento, pode se tratar de uma ilusão afetiva ou mesmo de falhas na leitura.

Aluna: Marília Azevedo DRE:105085878 Turma Teolit IV 9:20 às 11:00h

Bibliografia:

COMPAGNON, Antonie. O demônio da teoria. Belo Horizonte: UFMG,2003