terça-feira, 30 de junho de 2009

Análise - "O Espelho" Machado de Assis

Análise do conto “O espelho” de Machado de Assis

Aquele que se vê no espelho é muito mais rico do que a imagem que ele vê. Essa imagem é a maneira como os outros o veem.


O conto tem como espaço físico Santa Tereza, um bairro bucólico de classe média no Rio de Janeiro onde, à época, residiam muitos funcionários públicos. Se passa no final do século XIX.
O texto começa com presença de ironia, que aparece no trecho que diz que os cavalheiros resolviam os mais árduos problemas do universo. Talvez por conta da sabedoria e hierarquia mantinham-se amigáveis. O “quatro ou cinco” deve-se ao fato do quinto cavalheiro estar calado, cochilando, mas é descrito como capitalista, inteligente, provinciano. O fato de não discutir justifica-se por seus princípios, mas ele mostra ser alguém que se coloca acima dos outros. Uma vez que diz que a discussão é “bestial”, compara-se aos Serafins e Querubins, que não se controvertiam eram a perfeição.
O pequeno diálogo mostra uma conversa dentre “cavalheiros”.
O personagem descrito como Casmurro monopoliza a conversa no meio da noite .
“Pensando bem...” já estavam na discussão sobre a alma.
Todos tinham uma opinião diferente.
Pedem a opinião da personagem, ele enfatiza que fará um discurso, de cunho performativo, e impõe que os outros fiquem calados.
Logo no início de sua afirmação sobre a existência de duas almas - e não uma só - reforça a ideia de que não admite réplicas e ameaça deixar o local caso isso aconteça.
A comparação do homem com a laranja é uma metáfora intrigante, já que a fruta, tipicamente brasileira, quando cortada ao meio parece o sol, podendo ser feita aí uma relação de sol – luz – conhecimento. A perda de uma das metades (almas) implica na perda de metade da existência e em alguns casos, a da existência inteira, explica citando o caso do judeu que perdeu seus ducados e sente-se morto devido a isso.
O cavalheiro explica ainda que a alma exterior não é sempre a mesma, e que não se refere a almas como de Camões, César e Cromwell que ele chama de exclusivas, possivelmente pelo fato de serem figuras que morriam pela pátria.
Exemplos de evolução do valor da alma exterior, digo evolução hierárquica, do menor para o maior. Quando cita a senhora cuja alma exterior muda constantemente de acordo com a estação e diz ser o nome dessa senhora Legião e parenta do demônio, parece referir-se aos seres que vendem a alma ao diabo, vendem a interior e vivem das mutações da exterior, já que a outra não mais lhes pertence.
O cavalheiro consegue fazer com que os quatro também cavalheiros esqueçam a controvérsia e atentem-se apenas aos seus relatos, prometendo um episódio ocorrido nos seus vinte e cinco anos.
A atenção na sala é apenas para as suas palavras e os olhares parecem contemplar um deus da sabedoria.
Começa a sua narração já deixando claro que era pobre e fora nomeado alferes da guarda nacional, relata o orgulho da família e o despeito de outros que almejavam o cargo de uma forma peculiar que nos leva a imaginar o ranger de dentes.
O título de alferes é mostrado de maneira sarcástica quando todos querem demonstrar sua satisfação, até mesmo a tia que o mantém no sítio, o abraça e exalta de forma exagerada, demonstrando dessa forma o valor que o ser humano dá ao “externo”. Esse valor é reforçado com a atitude de todos, que chamam-no de “O alferes”.

“Senhor Alferes” tinha deixado de ser o Joãozinho para eles, mostra aqui o valor de um título. O fato de ser o primeiro servido, o espelho que a tia havia colocado em seu quarto, embora velho, ainda poderia ser olhado como uma peça rica. O fato de o espelho ter sido retirado para compor o ambiente do Senhor Alferes e fazer parte da decoração da sala, além de ser a melhor peça ali exposta demonstra uma vez mais o valor dado ao exterior, no qual o ser humano está impregnado. Quando relata sua transformação e diz que o alferes eliminou o homem, entende-se que a alma exterior - que antes valorizava as coisas simples como “o olhar da moça” - passaria agora a matéria, possuindo valor apenas material. A parte materialista toma conta do ser, impregnando-o e dispersando a sua outra parte: laranja – sol – sabedoria. “O alferes eliminou o homem”.
A saída repentina da tia em viagem e os escravos aproveitando-se do momento oportuno para abandonarem a casa faz com que Jacobina fique abismada com toda sua solidão e os penosos dias angustiada pela repentina perda de sua alma exterior, uma vez que a interior se tornou dependente daquela. Deixa nítido o quanto os elogios e mimos haviam se tornado importantes para ele, que vivia agora do externo.
Permaneceu no sítio sem olhar-se no espelho, inconsciente. Receava encontrar-se em dois, quando decidiu olhar, espantou-se ao ver uma imagem difusa – a imagem refletida que não conseguia ver com nitidez parecia ser a interior mesclada a exterior, praticamente encoberta.

Decide vestir-se com a farda de alferes. Algo naquela imagem difusa o incomodava. Enquanto vestia-se, olhava em direção ao espelho, onde via sempre uma sombra, algo indefinido.
Quando termina de vestir-se e olha novamente para o espelho, que reflete o seu eu exterior integralmente, sente-se como se despertasse de um sono.
Ao narrar as sensações olhando-se no espelho, demonstra o quanto a alma exterior o preenchia, contando que conseguiu atravessar mais seis dias de solidão sem os sentir, vivendo esses dias da sua alma exterior. Machado exprime a mascaração, ambiguidade e fragilidade do ser humano.
O fato de o conto terminar com a retirada de Jacobina da sala sem aguardar indagações reforça a ideia a respeito da personagem que despreza a discussão única e simplesmente pelo fato de desprezá-la, e mais: o ser humano aparece aqui como algo inacabado e que vive envolto de uma mascaração de aparência e sentidos.

Matheus de Almeida Marques - LER - 105068533

Um comentário:

  1. Matheus, o seu texto acompanha o conto do Machado, mas quase não produz análises, isto é, você basicamente se limita a comentá-lo. Não está ruim, mas não vi aqui nada do que discutimos durante o período. Enfim, fazia tempo que eu não lia o conto, foi bom para relembrá-lo... Boas férias e um abraço.

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