terça-feira, 23 de junho de 2009

Faces da Obra Literária

Este trabalho tem como objetivo atingir três metas:

• Abordar;

• Analisar;

• Distinguir;

Para completo entendimento iniciemos com a abordagem.

Para esse item, e em todo decorrer do trabalho, utilizamos o poema Rosa de Hiroxima, de Vinicius de Moraes – poeta essencialmente lírico, o poetinha (como ficou conhecido) notabilizou-se pelos seus sonetos. Sua obra é vasta, passando pela literatura, teatro, cinema e música. No campo musical, o poetinha teve como principais parceiros Tom Jobim, Toquinho, Baden Powell, Carlos Lyra.

Seu poema, Rosa de Hiroxima, depois de escrito, na década de 70 foi musicado, por Gerson Conrad, para o grupo Secos & Molhados e atingiu enorme sucesso. Ainda hoje, é conhecida e principalmente comentada, não só por especialistas da área musical, mas principalmente por estudiosos da ciência da literatura.

Quando referimo-nos em abordar, nossa intenção é realizar todo um estudo com um texto literário. Pretende-se, aqui, mostrar não somente a obra e o autor, mas trabalhar o poema. Identificar seus estranhamentos, questionar o porque ser uma obra literária e comentar suas características mais marcantes.

Num segundo tópico, seria analisar. Seria comentar sobre os conceitos de Literatura e texto literário. Conceitos mais variados possíveis rodam atrás desse delicado tema e apesar de defini-lo ser uma tarefa que necessita muito cuidado, é possível afirmar que desde logo se percebe que se está diante de uma utilização especial da língua que falamos. O ritmo que caracteriza o texto, a natureza do que se comunica e, ao chegar até nós por escrito, a distribuição das palavras no espaço, justificam essa afirmativa.

A partir do contato com o texto, e das marcas de uma obra literária, apresentaremos num certo momento, dados que numa primeira visão podem passar despercebidos, mas que funcionam internamente com poema. Características que permitem o leitor interpretá-lo e compreendê-lo de uma forma mais abrangente e não só com a forma estética da poesia. Classificação quanto a um gênero, o que faz dele um poema lírico, seus traços, também serão discutidos nesse trabalho.

“Arte Literária é mimese; é a arte que imita pela palavra.” (Aristóteles, filósofo grego, Grécia Antiga)

“A literatura é a expressão da sociedade, como a palavra é a expressão do homem.” (Louis de Bonald, pensador e critico do Romantismo francês, inicio do século XIX)

“A poesia existe nos fatos.” (Oswald de Andrade, poeta brasileiro, século XX)

“É com bons sentimentos que se faz literatura ruim.” (André Gide, escritor francês, século XX)

Baseando-nos em cima de definições como essas, que traçamos o ponto de partida para a discussão sobre o que é Literatura e o que é Realidade. Ultrapassando as barreiras das definições, chegamos então à maneira como a arte é passada para nós. O discurso que é utilizado. Em outras palavras, chocaremos então com a Linguagem Literária. Compreendendo os traços de uma obra literária, passamos então a minuciosa Abordagem Poética.

ANÁLISE DO POEMA

ROSA DE HIROXIMA

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas

Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroxima
A rosa hereditária

A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica

Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada


(MORAES, Vinicius de. “A rosa de Hiroxima.” In:__. Antologia Poética. São Paulo, Companhia das Letras, 1998. p.196-197)


O poeta faz a mímesis do infortúnio acontecido em Hiroxima e procura enfatizar a causa disso, que é a bomba. Nessa criação de uma nova realidade, ele desutensiliza o vegetal rosa e o compara ao artefato de guerra, o qual, ao explodir, assume um formato rosáceo.

Ligado a isso está a conotação e a plurissignificação, que estão bastante voltadas para o valor, a representação e o significado que o signo lingüístico passa a ter, diferentemente do sentido real. Vê-se isso no poema quando há a metáfora da bomba com a rosa. Enquanto esta é cheia de vida, beleza, delicadeza, perfume, aquela é totalmente o oposto (“A anti-rosa atômica/Sem cor sem perfume/ Sem rosa sem nada”). A plurissignificação também está presente quando é citado somente pessoas do sexo feminino nos primeiros versos em antítese com a bomba. Ou seja, a mulher é geradora de vida, enquanto que o explosivo a interrompe (“Pensem nas mulheres/Rotas alteradas”).

Algo que está constantemente representado no poema é a literariedade, isto é, o escritor transforma algo o qual não apresenta nada de poético e de sensível, que é a bomba e o que ela ocasionou, em algo simbólico, literário e expressivo. Vinicius de Moraes consegue enxergar literatura numa situação dessas, quebrando a rigidez dos usos lingüísticos e provocando originalidade na organização da mensagem.

Nota-se que a função emotiva, a qual está diretamente voltada aos sentimentos do emissor, é a predominante no poema. O eu-lírico expressa seu desejo de que a humanidade não se esqueça da bomba de Hiroxima, que foi a responsável pela grande catástrofe ocorrida na cidade, como se vê nos oito primeiros versos. Que as pessoas pensem nas conseqüências sem deixarem de lado o que ocasionou o problema.

Ao expor o que sente, pelo que anseia, o eu-poético faz um apelo, tenta exercer influência sobre a maneira de pensar do leitor. A partir dessas características, evidencia-se a presença da função apelativa, que está centrada no receptor. O uso de verbos no modo imperativo (“Pensem”, “Não se esqueçam”) exemplifica essa função da linguagem.

A função poética, a qual é orientada para a mensagem, também caracteriza o poema. Há a ocorrência de ritmo, repetição de palavras para dar ênfase no que se trata (“pensem”, “rosa”, “sem”), figura de linguagem (ex.: metáfora de bomba e rosa), grande uso de oclusivas ([p], [t], [d]) para dar um efeito de explosão e vários outros indícios da existência da função poética.

Após tantas definições sobre o que é literatura, Literatura e Realidade, Linguagem Literária, Abordagem poética, e baseada em análises, do poema “Rosa de Hiroxima” de Vinicius de Moraes, percebe-se que na literatura nada é “em vão”. Tudo tem um significado, tudo nos remete a outro plano; plano diferente do que estamos acostumados a viver, a nos introduzir. Nossa vida em casa, na escola, no trabalho é repleta de objetividades, todos nós já temos padrões pré-estabelecidos de afazeres e comportamentos, e nosso dialogo no dia-a-dia é, em sua generalidade, denotativo. Mas na literatura, não. E justamente o que diferencia um texto literário de um texto não literário é essa dimensão em tempo e espaço que só a literatura pode trazer.

Vimos no poema de Vinicius de Moraes que as palavras, as construções excedem o plano real. Tudo, no texto, leva a um tele-transporte, ao pensamento que podemos ter, erroneamente, esquecido, que foi a tragédia devastadora da bomba que impactou as cidades japonesas de Hiroxima e Nagazaki, no contexto da Segunda Guerra Mundial. Esse impacto não foi só no espaço físico da região; onde, em algumas áreas, não cresce mais vegetação tal o impacto radioativa que sofreu. Agora, imaginemos as pessoas que são indiscutivelmente mais frágeis que a pedra que compõe o solo. No entanto, só no campo da literatura que se tem tal possibilidade de intercalação de sentidos, entre o real e o figurado, a fim de transmitir alguma mensagem a um interlocutor.

Um vasto leque de “ferramentas” tem o artista a fim de construir tal texto. Desde os vocábulos (diz-se vocábulos, pois, na área da literatura, as palavras esvaziam-se de seus significados e passam a incorporar o sentido que o poeta quer dar à elas, seja lá qual for), que, pelo uso das figuras de linguagem, de pensamento e de palavras, transvertem o sentido que as forem designadas para alcançarem o imaginário infindável do leitor. A ordem das orações não necessariamente, e não comumente, nos textos literários, é direta e sistemática, com regras prescritas, exigíveis formalmente. Mas, aqui no texto “A Rosa de Hiroxima” a ordem das frases é direta, objetivando assim a clareza do texto ao tratar de um assunto de tamanha seriedade. Na construção da obra literária extrapola-se até os limites morfossintáticos; todavia, num poema não é só o prescritível que conta; o ritmo, a sonoridade, o campo fônico em geral também é de extrema relevância e singularidade na classificação de um texto de tal gênero.
Dito isso, compreende-se que a função da linguagem literária é projetar o leitor ao mundo que o poeta quiser, à atmosfera do texto. O poeta tem em suas mãos caneta, papel e uma idéia (onde os parnasianos,analogamente, diziam que eram jóias e o poeta, o ourives); daí ele começa a trabalhar lançando mão dos artifícios que abordamos ao desenrolar do trabalho, baseadas no poema “Rosa de Hiroxima”. Artifícios tais que foram genialmente usados por Vinicius de Moraes; que já eram usados há séculos atrás; que são usados, por outros poetas, hoje; e que continuarão provavelmente, a perpetuar as entrelinhas dos poemas futuros, nas mãos de outros, igualmente brilhantes, artistas. Levando quem os lê ao mundo da literatura.


BIBLIOGRAFIA

Neste trabalho utilizamos as seguintes fontes de pesquisa:

http://weblivre.br101.org

http://www.centopeia.net

Ambos visitados no dia 14 de Junho de 20009 às 18h.

CÂMARA Jr., Joaquim Mattoso. Dicionario de filologia e gramática referente á língua portuguesa. 2. Ed. Ref. Rio de Janeiro, J. Ozon, 1994.

DUCROT, Oswald & Todorov, Tzvetan. Dictionnaire encyclopédique des sciences du langage. Paris, Seuil, 1972.

DE NICOLA, José. Língua, Literatura & Redação. Editora Scipione. Volume 1. 1999

http://www.amorizade.wordpress.com/category/recursos-expressivos/page/3/

Esse último foi visitado no dia 14 de Junho de 2009 às 21h47min

http://www.manancialdasflores.com.br/biblioteca/flores.htm

http://www.priberam.pt/dlpo/gramatica/gramatica49.aspx

http://www.priberam.pt/dlpo/gramatica/gramatica49.aspx

http://www.brasilescola.com/gramatica/interjeicao.htm



Por
Fernanda Paschoal da Silva, DRE: 108062251
Camila Maciel Pires, DRE: 108062316

Um comentário:

  1. Fernanda e Camila, gostei do trabalho de vocês. O texto poderia ter um pouco mais de fluidez, mas vocês tocaram em questões importantes que vimos durante o período, como a literariedade e o estranhamento. Muito bom, parabéns. Abraços e boas férias. As notas seguem após a leitura de todos os trabalhos.
    Ps. tomei a liberdade de modificar a grafia de Hiroxima, para ficar de acordo com o poema, tal como foi escrito.

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