quarta-feira, 17 de junho de 2009

Oposições: Charles Baudelaire e Formalismo Russo

"A poesia é linguagem em sua função estética. Deste modo, o objeto do estudo literário não é a literatura, mas a literariedade, isto é, aquilo que torna determinada obra uma obra literária. E, no entanto, até hoje, os historiadores da literatura, o mais das vezes, assemelhavam- se à polícia que, desejando prender determinada pessoa, tivesse apanhado, por via das dúvidas, tudo e todos que estivessem num apartamento, e também os que passassem casualmente na rua naquele instante. Tudo servia para os historiadores da literatura: os costumes, a psicologia, a política, a filosofia. Em lugar de um estudo da literatura, criava-se um conglomerado de disciplinas mal-acabadas. Parecia-se esquecer que estes elementos pertencem às ciências correspondentes: História da Filosofia, História da Cultura, Psicologia, etc., e que estas últimas podiam, naturalmente, utilizar também os monumentos literários como documentos defeituosos e de segunda ordem. Se o estudo da literatura quer tornar-se uma ciência, ele deve reconhecer o 'processo' como seu único 'herói'."

Consideração de cunho formalista feita por Roman Jakobson, um dos maiores lingüistas do século XX e pioneiro da análise estrutural da linguagem.


O Formalismo Russo foi uma escola literária e de pensamento que preconizava a forma, o texto em si, a literariedade acima de qualquer aspecto social externo. Para os formalistas, a linguagem se valia da própria língua, quase uma metalinguagem poética. Os Formalistas russos foram os primeiros a estudarem e analisarem o texto buscando, nele mesmo, seu sentido. O contexto não importaria, mas sim todos os mecanismos lingüísticos utilizados pelo autor na composição de uma poesia tais como a métrica, as rimas e a sonoridade, as figuras de linguagem, a conotação, as relações que as palavras tinham umas com as outras no intuito de provocar emoções ou novos significados, as personagens, enfim, tudo que o texto apresentasse ali, no papel, que pudesse ser lido e visto pelo leitor.
Embora o panorama instaurado a época do Formalismo fosse propício a esse tipo de crítica literária padrão, (o Formalismo nasceu em meio à Revolução Russa) este tipo de visão literária é amplamente criticada exatamente por não levar em consideração o ambiente extrínseco ao poema.
Não seria possível, por exemplo, a análise de um poema de Charles Baudelaire, considerado o precursor do Simbolismo, através de uma visão formalista. O Simbolismo caracterizava-se pela interpretação da realidade de maneira intuitiva. É um estilo literário e artístico completamente subjetivista, que não se preocupava com a forma, mas com o conteúdo do poema. A realidade é focalizada através da maneira como o poeta a vê. Dessa maneira, não basta somente olhar para um poema de Baudelaire e tirar dele uma análise objetiva, crítica e fria. É preciso mais que palavras escritas no papel. Para compreender um poema baudelaireano é preciso ter sentimento, um não compromisso com a realidade física e palpável. Até é possível fazer uma viagem ao interior do leitor/crítico para se entender o poema. Somente as palavras negras sobre um papel branco não são suficientes para dar conta da imensidão de um poema.
Pensando numa contraposição de uma análise formalista de um poema de Charles Baudelaire, foi feita a escolha de um poema em prosa. De acordo com os formalistas, a forma e métrica eram muito importantes. Este poema já quebra essa “regra” por nem ter formato de poema. Para os formalistas, seria uma pobreza lingüística o que será apresentado.

O ESTRANGEIRO
- Diga, homem enigmático, de quem gosta mais? De seu pai, de sua mãe, de sua irmã ou de seu irmão?
- Não tenho pai, nem mãe, nem irmã, nem irmão.
- Amigos?
- Você usa de palavras cujo sentido até aqui desconheço.
- Pátria?
- Ignoro a que latitude se situa.
- Beleza?
- Deusa e imortal, de bom grado a amaria.
- O ouro?
- Odeio-o como você odeia a Deus.
- Mas que gosta então, estrangeiro extraordinário?
- Das nuvens... as nuvens que passam... lá longe... lá longe... as maravilhosas nuvens!
Charles Baudelaire




Elementos como rima ou métrica não há. Jogos de palavras? Tampouco. O que há é sentimento, impressão do que o autor tem e quer passar ao leitor. Não há por onde começar uma análise formalista já que não é um poema formal Este poema é algo a mais. Tem a função poética como seu guia, mas a forma de um diálogo simples, com perguntas, respostas, pontuação adequada à prosa. Mas Baudelaire insistia, não era prosa, é poesia.
O poema se inicia com um diálogo seco, estranho, não familiar, frio e até hereges em certo ponto. Porém se desfecha como se tivesse virado para a posição oposta de onde convergia. “as maravilhosas nuvens!”. Este desfecho derruba o sentimento de estranhamento no começo do poema. Traz o personagem para mais perto do leitor. Quem nunca olhou para o céu e viu desenhos e formatos nas nuvens? É possível que o estrangeiro só gostasse das nuvens porque delas ele faria o que quisesse: enxergaria qualquer coisa de acordo com suas vontades e possibilidades. Poderia segui-las até onde quisesse ou pudesse seguir. Estavam longe na distância física, mas perto da visão e imaginação do forasteiro. É um estrangeiro, sem pátria, sem família, sem vínculos. Solto como as nuvens no céu que vão para onde o vento as leva. Sem compromisso com a moral ou os bons costumes, nega Deus. Seu compromisso era com sua filosofia de vida, era com ele mesmo. Se ele se importasse com o que diriam de suas respostas não as teria respondido. Mas sim, respondeu-as como achava que deveria. Se amasse, amaria a beleza a beleza, que é subjetiva; não se importa com dinheiro, vil metal que causa confusões e aprisiona. Solto e disposto a continuar solto.
E quanto ao entrevistador, esse também é personagem importante do poema. Ele faz perguntas simples de começo, mas sabe que o entrevistado não pode dar-lhe respostas comuns. Não à toa, o entrevistador não o chamaria de “enigmático” ou “extraordinário”. A cada pergunta feita uma expectativa é gerada; após a primeira, as outras perguntas são feitas com uma só palavra, dando abertura para o estrangeiro falar o que bem entendesse sobre tal. No fim, como que para preencher sua expectativa e curiosidade, o entrevistador faz uma pergunta objetiva, direta, sem dar chance para titubeios ou devaneios. E assim, o poema começa a florear.

Maria do Carmo Caroline Barros Cruz
DRE: 107366733
Teoria Literária 3

Referências:
http://literatura.uol.com.br/literatura
http://pt.wikipedia.org
http://www.portalliteral.com.br
http://www.substantivoplural.com.br/entrevista/

2 comentários:

  1. Recebi o trabalho por email e imediatamente o postei.

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  2. Oi Maria do Carmo, acabo de ler seu trabalho. Você usou a estratégia de escolher um poema com poucos aspectos formais (ou com as pectos formais menos aparentes) para mostrar os limites da abordagem formalista. É uma boa estratégia, mas é preciso lembrar que o formalismo trouxe contribuições e indagações importantes para o campo literário. Entre essas indagações, uma crucial: o que faz com que o poema seja poema? Talvez seja menos importante as respostas que os diferentes formalistas deram, mas o próprio fato de ter sido feita a questão, uma questão que continua válida ainda hoje, para qualquer poema que viermos ler. De toda forma, o trabalho ficou interessante, você merece uma boa nota, já que tem boas intuições. Um abraço e boas férias. Passarei as notas por email ao final de todas as correções.

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